CPLP

CPLP
CPLP

segunda-feira, 30 de junho de 2014

ESCREVER - Emanuel Medeiros Vieira

(ESCREVER) 
          POR QUE ESCREVEMOS?
            EMANUEL MEDEIROS VIEIRA*
Começamos escrevendo para viver e acabamos escrevendo para não morrer.
Para quem edifica palavras mal rompe a aurora, escrever é inadiável e urgente, mesmo que nada externamente nos obrigue a isso. Mas a necessidade interna é visceral,  orgânica, chama e fogo, flecha, algo colado à pele.
Não conseguimos escapar desse apelo.
Escrevemos para perdurar, para vencer a poeira do tempo, para despistar a morte, para regar nossos fantasmas e (por que não?), para amar e se amado.
A literatura é o refúgio da sinceridade num mundo de pose.
A literatura é um apelo de fogo, onde mora meu desespero, a minha inquietação e o meu paraíso”, escreveu alguém.
Eu sei: tento escrever um hino de amor à palavra.
Qual a maior viagem (interior) que podemos fazer, senão aquela que é um mergulho no livro, nesta criação de outros mundos, nessa peregrinação às áfricas interiores?
“Se o mundo dos objetos palpáveis e vida prática, não é mais real que o mundo das ficções, dos sonhos e dos labirintos, então pode ser que o autor de artifícios verbais tenha mais direito à condição de demiurgo que qualquer outro candidato”, escreveu Samuel Titan Jr., falando sobre Borges..

Hoje, a realidade chamada virtual fica sendo mais importante que o humano propriamente dito.
Uma personalidade não aparece porque é boa, mas é boa porque aparece.
Vivemos uma mudança de época e não uma época de mudanças.
Ou está inapelavelmente decretado que não há nada mais a fazer, que o destino já rabiscou todos os destinos?
Queremos um modelo de consumidores ou de cidadãos?
Aceita-se passivamente um mundo onde são as coisas que comandam e não os valores.
Queremos pessoas abúlicas, inertes, numa globalização onde impera a uniformidade e não a igualdade?

A literatura é um sonho do eterno. Sua  morte tem sido decretada diariamente.
Mas por que ela continua tão viva?
Pois há dentro do homem uma sede de infinito que nenhum modelo meramente mercantil pode saciar.
*Emanuel Medeiros Vieira é escritor
Seu romance “Olhos Azuis – Ao Sul do Efêmero”(Thesaurus Editora/FAC, Brasília, 2009), recebeu o Prêmio Internacional de Literatura, promovido pela União Brasileira de Escritores – UBE, em 2010.
Foi contemplado com o respeitado “Prêmio Lúcio Cardoso” para o melhor romance – na avaliação da entidade – publicado no Brasil em 2009.

terça-feira, 24 de junho de 2014

EMIGRADOS - Emanuel Medeiros Vieira

                                                In Correio Braziliense, enviado pelo Autor

sexta-feira, 6 de junho de 2014

CORUNHA - EXPOSIÇÃO E PALESTRA S/ BRASÍLIA, 50 ANOS DA INAUGURAÇÃO

Por convite pessoal do Presidente da Associação Cultural Alexandre Bóveda, da Corunha, em 13 de janeiro de 2011 procedeu-se à abertura da Exposição dos 50 Anos da Inauguração de Brasília, capital do Brasil, precedida de Palestra sobre o tema proferida por mim (Carlos Jorge Mota).
Esta Exposição foi feita na sequência de outras já ocorridas em território português, nomeadamente em Guimarães, Prado, Porto e Arouca. Outras se seguiram, também com Palestras por mim asseguradas, quer em Portugal quer na Galiza, nomeadamente na Ordem dos Engenheiros, também na Corunha, e em Santiago de Compostela, no Museu Ferroviário. 













Após a Palestra e inaugurando a Exposição

(Vídeo concebido com base em pequenos vídeos sucessivos que, acoplados, apresentam alguma deficiência. Lamentavelmente, quando eu ia precisamente iniciar o tema concreto sobre Brasília, após a narração das razões da minha presença na Corunha, face à trajetória de vida que proporcionou o evento, a bateria da máquina de filmar ficou sem carga. Fica a intenção. As minhas desculpas, embora, como é óbvio, não fosse eu o operador)

DIA DE GOA

  • No dia 14 de setembro de 2013, entre as 14:30 e as 19:00, no Palacete do Príncipe das Beiras, em Guifães-Maia, em parceria da respetiva Junta de Freguesia com a Associação PTLP-POR TI LÍNGUA PORTUGUESA, e também com a presença de indivíduos de nacionalidade portuguesa mas nascidos na península indostânica, foi celebrado o Dia de Goa cujo Programa incluiu Palestras, Poesia, Exposição de Pintura, Música, passagem de vídeos sobre Goa, Damão e Diu, gastronomia goesa, outras atividades lúdico-culturais diversificadas, e ligação, via Skype, a Goa e a Londres, onde se encontra forte colónia do ex-Estado Português da Índia, territórios hoje integrados na União Indiana.
Presidente da Junta de Freguesia de Gueifães, ladeado por Ganganeli Pereira e Maria dos Santos Leite

Presença de 3 elementos de descendência indostânica

Ganganeli Pereira, nascido em Goa, no uso da palavra
 
Presidente da Junta de Freguesia entregando uma medalha a Ganganeli, na sua qualidade de elemento da APTLP

                                                             



                                                        D. Telma Menezes falando com Goa e Londres, via Skype
                                                                  

Aspeto da Assistência



Gastronomia portuguesa e indostânica

Carlos Jorge Mota no uso da palavra

                      
                                       



Pinturas de Ganganeli  exibindo evocações lusas

    
  •                                                                                         Presidente da Câmara Municipal da Maia

CÃO - AMIGO E PROTETOR

Quem poderá garantir que os animais não têm inteligência, e vasta? O comportamento deste Cão leva-nos a refletir sobre esta temática. Só o afeto determina esta postura? Como sabe o animal que a criança carece não só de condescendência, mas, e acima de tudo, de proteção?


OPERAÇÃO MAR VERDE

Operação MAR VERDE foi o nome de código dado a uma operação militar planeada pela Forças Armadas Portuguesas e realizada em 22 de novembro de 1970, pelo Destacamento de Fuzileiros Navais Especiais nº 21 da Armada Portuguesa, através de meios navais, sob a responsabilidade do Comandante Alpoim Calvão, e consubstanciada nos objetivos de ataque anfíbio a Conacri, capital da República da Guiné, para libertar Prisioneiros de Guerra Portugueses detidos pelo PAIGC, destruir lanchas daquele Movimento de Guerrilha e eliminação física do então Presidente da República Sékou Touré. Todos os objetivos foram alcançados, com exceção da morte de Touré, que não se encontrava no país. O palácio presidencial foi tomado e a maior parte da Força Aérea da Guiné-Conacri foi destruída.
  




Foto tirada 27 anos depois (Jornal Expresso). Alpoim Calvão é o 2º da primeira fila a contar da esquerda










Depoimento de Camaradas que tiveram o infortúnio do Cativeiro. Alguns militam hoje comigo na instituição ONG TABANCA PEQUENA cuja finalidade é incrementar os laços de união do povo português e o da Guiné-Bissau consubstanciada na angariação de fundos, através de realização de eventos e oferendas, para aplicação em abertura de poços de água potável, apetrechamento hospitalar e outros benefícios em favor da população daquele país.










(Artigo de fundo publicado pela Revista do Jornal Expresso em 29 de novembro de 1997)

quinta-feira, 5 de junho de 2014

É PRECISO É SONHAR

Imaginação do moçambicano idealista. No norte de Moçambique


quarta-feira, 4 de junho de 2014

ANGOLA - KUANDO KUBANGO

Desenvolvimento das Terras-do-Fim-do-Mundo, no Kuando-Kubango, mas que exige uma prévia desminagem de todo o material armadilhado durante a Guerra Civil e da Invasão Sul-Africana


terça-feira, 3 de junho de 2014

ESTADO PORTUGUÊS DA ÍNDIA - HISTÓRIA, INVASÃO

Os Enclaves portugueses na Índia
(Goa – Damão – Diu)

UNIÃO INDIANA
(mais toda a Cachemira)






Operação Vijay  - 18 a 19/12/1961

Em 18/19 de Dezembro de 1961 tropas indianas invadiram Goa, Damão e Diu. Portugal viria a reconhecer a soberania indiana em 1974, com Mário Soares. Desde 1987 que Goa é um estado na União Indiana, tendo sido de 1961 até 1987 um "Union Territory". Para saber mais sobre a história milenar de Goa até os nossos dias veja.
Cronologia dos Acontecimentos

Do livro "Cronologia Geral da Índia Portuguesa - 1498-1962" de Carlos Alexandre de Morais, Referência/Editorial Estampa
1947
A 15 de Agosto, a Grã-Bretanha concede a independência à União Indiana e ao Paquistão.
1948
A 12 de Agosto, os governos de Portugal e da Índia decidem trocar representantes diplomáticos ao nível de legação.

São perseguidos os goeses que, residindo na Índia, não reneguem a nacionalidade portuguesa. Nehru afirma: "Goa é parte da União Indiana e a esta deve regressar".

A 27 de Fevereiro, o Governo da União Indiana solicita ao Governo português que se iniciem negociações quanto ao futuro das colónias portuguesas na Índia.

A 15 de Julho, o Governo português responde declarando que a questão apresentada "não se pode discutir e muito menos aceitar para ela a solução que se lhe propõe".
1951
Infiltram-se no território de Goa elementos da União Indiana.
1953
Salazar afirma que se Nehru recorrer à força negará ao mundo a sua política pacifista.

A 11 de Junho, o governo indiano retira de Lisboa a sua missão diplomática, mantendo os portugueses a sua em nova Deli.

Nos finais do ano, a União Indiana institui o bloqueio a Goa. Exigências de visto paralisam a circulação de pessoas e funcionários portugueses entre Goa, Damão e Diu e os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli.
1954
A 22 de Julho, cidadãos da União Indiana, vinda daquele país, alguns armados e enquadrados por forças regulares da Polícia e de tropas de reserva, assaltam o enclave de Dadrá, onde morrem em combate, o subchefe da Polícia e o guarda António Fernandes. O mesmo processo é utilizado horas depois, no assalto ao enclave de Nagar-Aveli.

É expulso o cônsul da Índia em Goa e Nova Deli expulsa os funcionários portugueses de Bombaim.

Na noite de 15 de Agosto um grupo de satyagrahis ocupa o Forte de Tiracol, no Norte de Goa, hasteando a bandeira indiana. Uma força policial portuguesa retoma-o, horas depois, hasteando a bandeira nacional. Há um morto e alguns feridos entre os indianos.

Em discurso proferido, em 30 de Novembro, na Assembleia Nacional, Salazar afirma que considera Goa indefensável.
1955
A 8 de Agosto, a União Indiana decide encerrar a legação portuguesa em Nova Deli.

No parlamento indiano Nehru afirma: "Nós não estamos dispostos a tolerar a presença portuguesas em Goa, ainda que os goeses queiram que eles aí estejam".
1956
Elementos provenientes da União Indiana violam as fronteiras, roubam e causam mortos e feridos entre a população e o pessoal da Polícia.

O embaixador Marcello Mathias defende, junto de Salazar, que o problema de Goa seja resolvido por referendo. Salazar, em Conselho de Ministros, expõe o assunto nesses termos mas os ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros levantam as maiores objecções. A situação mantém-se inalterável.
1957
O general Humberto Delgado, candidato à presidência da República, defende o plebiscito para a resolução do caso do Estado da Índia.
1958
Em Goa, Damão e Diu continuam, quase diariamente, as incursões de agentes indianos, os roubos de bens e as agressões a goeses.

A 4 de Dezembro, chega a Goa o novo e último governador-geral da Índia Portuguesa, general Manuel António Vassalo e Silva.
1959
Na Índia Portuguesa, dos 226 cargos oficiais, 134 são desempenhados por goeses, 49 por portugueses da metrópole e 9 por descendentes de portugueses.
1960
Um importante núcleo de goeses, contrário à política do Governo central mas evidenciando repúdio pela integração na União Indiana, prepara um Projecto de Estatuto de Autonomia Administrativa e Financeira do Estado da Índia, que é enviado para Lisboa e rejeitado pelo chefe de estado.

Um grupo de destacadas figuras de Goa, sabendo que o primeiro-ministro da Grã-Bretanha MacMillan se dispõe a servir de medianeiro no caso de Goa, envia ao presidente da República um telegrama pedindo que sejam ouvidos os goeses nessa mediação e reclamando plena autonomia administrativa e financeira - pedido que o governo de Lisboa recusa.
1961
Khrishna Menon, ministro indiano da Defesa, pressiona Nehru no sentido de este ordenar o ataque a Goa. Salazar não acredita que este se concretize.

Recrudescem em Goa acções de que resultam mortos e feridos.

Verifica-se grande concentração de de meios militares indianos em redor das fronteiras de Goa, Damão e Diu. Do facto é avisado o Conselho da Segurança das Nações Unidas.

Ao largo de Damão e Diu cruzam-se navios de guerra indianos e ao largo do porto de Mormugão paira uma poderosa esquadra. Aviões de combate indianos violam o espaço aéreo português.

Datados de 14 de Dezembro, são recebidos pelo governador-geral dois telegramas do presidente do Conselho. O primeiro refere que há que contar com o pior e exorta as forças armadas do Estado da Índia ao sacrifício total. O segundo confirma que no dia imediato a União Indiana desencadeará o ataque.

Na noite de 17 para 18 de Dezembro, a União Indiana, com um exército de cerca de 50 000 homens, dispondo de moderno material de guerra e apoiado por poderosas forças aéreas e navais, invade e ocupa os territórios de Goa, Damão e Diu, defendidos por cerca de 3500 homens, deficientemente armados e municiados.



A resistência portuguesa distingue-se nas guarnições da ilha da Angediva, Forte de Aguada, Damão, Diu e aviso Afonso de Albuquerque.

No dia 19, dá-se a rendição das tropas portuguesas, que ficam prisioneiras das forças indianas durante cerca de seis meses.

Por solicitação de Portugal, é convocado o Conselho de Segurança das Nações Unidas em virtude da invasão do Estado Português da Índia. O Conselho condena a União Indiana mas a União Soviética opõe o seu veto.
------

Breve descrição dos   acontecimentos

Nos dias 17/18 de Dezembro de 1961, durante a denominada Operação Vijaya, 50 000 tropas indianas apoiadas por blindados, artilharia, meios aéros (aviões de combate Canberra) e navais (1 porta-aviões) ocuparam militarmente Goa, Damão e Diu.
Os 3500 militares portugueses e goeses tinham ordens de Salazar para lutar até à morte, sendo que o chefe-de-estado português comunicou que só esperava como resultado do combate "militares vitoriosos ou mortos". 
Contudo, o Governador Vassalo e Silva apercebeu-se da situação desesperada e perante o avanço dos indianos mandou recuar as forças e destruir todas as pontes e meios militares pelo caminho. 
Sem meios aéreos portugueses, a aviação indiana teve tarefa fácil ao destruir a torre de telecomunicações em Bambolim e a base militar em Dabolim. Pouco depois entravam em território de Goa, Damão e Diu as tropas da União Indiana, que ao contrário do que se esperava ainda se depararam com resistência de alguns militares portugueses, nomeadamente em Vasco da Gama, onde 500 militares fortemente armados obrigaram as forças indianas a combate.
Também a fragata Afonso de Albuquerque entrou em combate à frente da barra de Mormugão, mas foi presa fácil para os modernos navios indianos que a afundaram. 
A destruição de pontes por parte dos portugueses fez também com que a ocupação total se tenha prolongado por mais de 2 dias, porque as tropas indianas não tinham meios para passar os rios de Mandovi (á frente de Pangim), e Zuari (a sul de Pondá). Como tal tiveram de pernoitar à espera de prosseguir em condições e para aceitarem a rendição das forças portuguesas em 19 de Dezembro de 1961.


Tropas indianas marcham em Goa
Generais P. N.Thapar e Vassalo e Silva
Rendição das Tropas Portuguesas em Pangim










 
Generais-Comandantes assinando o Ato de Rendição


Mário Soares, MNE, assinando o restabelecimento diplomático com a União Indiana, em 31/12/1974


2 de Janeiro de 2001 (Diário de Notícias): 

"Só soldados vitoriosos ou mortos"
Na véspera da queda da Índia, Salazar pediu o sacrifício da vida aos três mil militares portugueses. Não os queria prisioneiros

José Manuel Barroso - 
Arquivo DN
A 3 de Janeiro de 1962, António de Oliveira Salazar, o líder e fundador do regime do Estado Novo, não leu o mais doloroso discurso da sua vida política. Perante uma Assembleia Nacional aturdida pela queda da Índia Portuguesa, um Salazar afónico "com as emoções das últimas semanas" teve de recorrer ao presidente do parlamento, Mário de Figueiredo, para a leitura de um texto de reconhecimento e de justificação de uma derrota, que iniciava o fim do Império Colonial Português, sem sequer poder invocar a gesta patriótica dos milhares de soldados mortos.
A 14 de Dezembro de 1961, três dias antes da invasão e ocupação do Estado Português da Índia (Goa, Damão e Diu) pelas forças da União Indiana, Salazar pedira aos soldados e marinheiros portugueses nos territórios um último sacrifício, o da vida.
Mal armados e em número reduzido (cerca de 4 mil efectivos), perante as forças indianas invasoras (cerca de 50 mil militares do Exército, Marinha e Força Aérea), resistir significava uma cruel e inútil auto-imolação para os efectivos portugueses. Nos dois dias da invasão, resistiram o que puderam, morrendo 26 militares. Mas o contingente português acabou por se render, a 19 de Dezembro, tendo o governador, general Vassalo e Silva, ordenado a "suspensão do fogo" às suas tropas.
Mais de 3 mil militares portugueses foram feitos prisioneiros pelo Exército indiano (entre os quais se encontrava o general Vassalo e Silva), os prisioneiros que Salazar não queria. Por isso puniu e perseguiu alguns dos oficiais em serviço na Índia - o que abriu dolorosa ferida nas Forças Armadas portuguesas e foi uma das raízes do derrube do regime de Salazar, doze anos depois da queda de Goa, Damão e Diu.
Na mensagem que enviou, a 14 de Dezembro de 1961, ao governador e comandante-chefe português do Estado da Índia, Vassalo e Silva, o chefe do governo de Lisboa reconhecia a "impossibilidade de assegurar a defesa plenamente eficaz" dos territórios, mas pedia ao general que organizasse essa defesa "pela forma que melhor possa fazer realçar o valor dos portugueses, segundo velha tradição na Índia". E ainda: "É horrível pensar que possa significar o sacrifício total, mas recomendo e espero esse sacrifício como única forma de nos mantermos à altura das nossas tradições e prestarmos o maior serviço ao futuro da Nação".
Sendo "impossível" a defesa "eficaz" dos territórios, dado a Índia poder multiplicar "por factor arbitrário" as suas forças de ataque - conforme Salazar reconhecia na sua mensagem - a ordem dada ao general Vassalo e Silva revelava-se inequívoca. "Não prevejo possibilidade de tréguas nem prisioneiros portugueses, como não haverá navios rendidos, pois sinto que apenas pode haver soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos". O telegrama de Salazar a Vassalo e Silva, ao reconhecer a "impossibilidade de assegurar a defesa", exigia mártires, que pudessem ser exibidos interna e externamente, em nome de uma política de intransigência que tinha como horizonte o futuro dos territórios ultramarinos de África - onde a guerra começara já (em Angola) nesse ano de 1961.
Por isso, na sua mensagem à Assembleia Nacional, a 3 de Janeiro de 1962, Salazar invoca o princípio da soberania nacional, tal como o definia o ordenamento jurídico da Constituição do Estado Novo. "Nós não podemos negociar, sem nos negarmos e sem trairmos os nossos, a cedência de territórios nacionais, nem a transferência das populações que os habitam para soberanias estranhas", disse Salazar. Era o fundamento de uma política de resistência.
A "questão da Índia" começara uma dezena de anos antes, com a independência da União Indiana. Desde 1948 que, directa ou indirectamente, as autoridades do novo país - a "jóia da Corôa" do império britânico - reclamavam a integração na grande Índia dos territórios que Portugal detinha sob sua administração, desde há quase cinco séculos (ler cronologia). Em 1950, o governo indiano solicita, formalmente, a Lisboa, a abertura de negociações, quanto ao futuro dos territórios portugueses. Portugal recusou sempre qualquer diálogo com a União Indiana.
Em 1953, o primeiro-ministro indiano, Nehru, afirma que, face à recusa portuguesa, o seu país não vê outra solução que não seja "a tranferência directa que assegure a fusão daqueles territórios com a União Indiana".
No seio do regime português discute-se a possibilidade de outras soluções, para preservar a autonomia dos territórios. Mas Salazar, reconhecendo embora que Goa (o maior dos três territórios) é, ele próprio, militarmente indefensável, entende que um plebiscito ou mesmo a independência não constituem soluções, uma vez que Nehru declara já as não aceitar.
A ideia do plebiscito atraía, então, um sector importante do regime, como forma de demonstração, por parte de Portugal, do respeito pela vontade das populações da Índia Portuguesa e como argumento perante a comunidade internacional. Mas o precedente que abria, para o Ultramar, solidificou a intransigência de Oliveira Salazar - e levou à humilhação na Índia.

Cronologia

SÉC. XV. O objectivo estratégico de Portugal, neste período, era a descoberta do caminho marítimo para a Índia (1498, por Vasco da Gama). O historiador britânico Arnold Toynbee divide a história do mundo em duas fases, a do homem pré-gâmico e a do homem pós-gâmico. "A forma como as religiões cristã, indostânica e muçulmana se desenvolveram, lado a lado, em Goa, durante séculos e em mútuo respeito, constitui uma das características da presença portuguesa no Oriente". O controlo naval do Índico é uma meta.

SÉC. XVI. D.João III define o seu conceito estratégico de "abandonar o norte de África, manter o possível na Índia e fazer o esforço no Brasil".


SÉC. XIX. Depois da independência do Brasil (1822), o esforço estratégico de Portugal no Ultramar dirige-se para África.

1947. A Grã-Bretanha concede a independência à Índia. Nesse ano, o primeiro-ministro indiano, Nehru, afirma que o seu país dará todo o apoio ao povo de Goa para conseguir a libertação.

1948. O goês António Bruto da Costa escreve a Salazar condenando o Acto Colonial e defendendo uma verdadeira autonomia administrativa do Estado Português da Índia.

1949. O governo indiano exige à Santa Sé a extinção do Padroado do Oriente, cessando o privilégio concedido a Portugal de designação de bispos para dioceses indianas _ reduzindo a Goa a arquidiocese de Goa.

1950. O governo indiano propõe ao governo português negociações para definição do futuro dos territórios portugueses na Índia. Lisboa rejeita a proposta. Negoceia com a Santa Sé a redelimitação da arquidiocese de Goa.

1954. A 30 de Novembro, em discurso na Assembleia Nacional, Salazar reconhece que Goa é indefensável militarmente.

1961. Redução dos efectivos militares portugueses na Índia (1960). A União Indiana ocupa militarmente o Estado Português da Índia e anexa Goa, Damão e Diu ao seu território
.


A Fortaleza de Damão

Textos
Rui Barata
De nada valeu o esforço dos fiéis que, naquela tarde de 16 de Dezembro de 1961, realizaram uma procissão a pé, de Pangim ao túmulo de São Francisco Xavier, em Velha Goa, para rogar ao santo que impedisse a iminente invasão do Estado Português de Índia (EPI) pela União Indiana. São Francisco fez ouvidos moucos às preces dos brâmanes católicos que dominavam a vida económica e política de Goa no tempo do colonialismo português, e dois dias depois do procissão religiosa as tropas indianas entraram triunfalmente no território. Findava aí, de maneira dolorosa para o orgulho nacional, o domínio português em Goa, Damão e Diu. E começava a derrocada imparável do império colonial português, cujo último acto se escreve amanhã com a devolução de Macau à China. Trinta e oito anos depois da invasão indiana - que para parte significativa do população representou a libertação do jugo colonial - o PÚBLICO foi a Goa ver o que resta da herança portuguesa.





Naquela madrugada de 18 de Dezembro de 1961, dia em que completou 18 anos, Manuela Barreto Xavier adormeceu portuguesa e acordou indiana. Mas permaneceu goesa, brâmane e católica, três qualidades que a colocam no cada vez mais reduzido grupo de pessoas que, em Goa e em muitos outros lugares do mundo, se sentem indianas por fora e portuguesas por dentro. Pessoas como o magistrado Eurico Santana da Silva, juiz do Supremo Tribunal de Bombaim e guardião de uma das mais monumentais casas indo-portuguesas do território; ou como Fernando Jorge Colaço, advogado com escritório em Pangim e estudioso incansável das leis e costumes portugueses. Ou ainda como Rosa Rodrigues, da aldeia de Cunchilim, cuja maior ambição na vida é viajar até Portugal para rezar em português no santuário de Fátima. São pessoas como eles que, 38 anos após a integração forçada do Estado Português da Índia (EPI) na União Indiana, mantêm viva a herança portuguesa em Goa, alimentada por um discurso de nostalgia por um passado que não volta. Encarados muitas vezes como um anacronismo, os "portugueses" de Goa estão a caminho de se transformar em mais uma casta no país das castas. A casta dos que, como refere Santana da Silva, "têm passaporte indiano e coração português".
Para encontrar uma explicação para tanto apego à cultura e à língua portuguesas, é preciso recuar no tempo. Recuar pelo menos até 1632, ano em que o Papa Gregório XV decretou que os brâmanes indianos que aceitassem converter-se ao catolicismo mantinham os privilégios da sua casta, podendo continuar a exibir publicamente os respectivos sinais distintivos. Esta decisão veio de encontro aos interesses dos portugueses, que desde a chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498, baseavam a sua autoridade na conversão de brâmanes e chardós (as duas castas superiores hindus), a quem era garantido o acesso a todos os cargos da administração local.
Alguns dos recém-convertidos mantiveram em segredo as práticas rituais da sua religião ancestral, como depois foi comprovado pelos desvarios da Inquisição. Mas muitos converteram-se definitivamente ao cristianismo, mantendo-se embora divididos em quatro castas. Os brâmanes ocuparam as mais altas posições no clero, nas profissões liberais e na administração. Os chardós, por seu turno, formaram uma aristocracia rural que acabou recompensada pelos portugueses com títulos de nobreza, enquanto os sudras e corumbins são, ainda hoje, maioritariamente camponeses e trabalhadores braçais.
Eram precisamente os brâmanes e os chardós católicos que dirigiam na prática o Estado Português da Índia (EPI) quando a União Indiana (UI) reclamou, pela voz do primeiro-ministro Nehru, a devolução de Goa, Damão e Diu. O Governo de António Salazar recusou estas pretensões e lançou-se numa batalha diplomática, tendo mesmo recorrido para o Tribunal de Justiça de Haia quando a UI anexou os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli. Enquanto Salazar hesitava sobre se devia invocar a aliança com a Inglaterra, as tropas indianas avançaram sobre Goa, Damão e Diu na madrugada de 18 de Dezembro de 1961, tendo encontrado fraca resistência. No território estavam aquartelados apenas cerca de 3500 soldados portugueses, naturalmente impotentes para resistir a um assalto de mais de 30 mil indianos. O velho cruzador Afonso de Albuquerque ainda resistiu à entrada do Porto de Vasco da Gama, mas acabou por afundar-se junto à praia de Dona Paula. O governador-geral do EPI, general Vassalo e Silva rendeu-se a 19 de Dezembro, reconhecendo que a defesa do território era "insustentável". Oliveira Salazar nunca lhe perdoaria esta atitude, demitindo-o do exército dois anos depois.
Começou então um período muito difícil para os brâmanes católicos e para os chardós. Perdem privilégios e terras. Quintas e várzeas de arroz que faziam a riqueza das casas senhoriais são divididas e entregues aos camponeses. "Vim a correr de Bangalore para garantir que a casa se mantinha na posse da família", recorda num português fluente a herdeira da família Menezes Bragança, proprietária de uma magnífica casa em Chandor (Salcete). Conhecida como "dama de Chandor" e descrita pelo escritor José Eduardo Agualusa como "a guardiã da memória de Goa", Aida Bragança viu-se obrigada a abrir a casa a visitas de turistas para preservar o espólio da família, que inclui preciosas peças de arte-sacra, porcelanas da China e da Companhia das índias e mobiliário indo-português em madeiras nobres e marfim. 
 Também os membros da administração local enfrentam problemas. Aos magistrados, por exemplo, é dado um prazo de 24 horas para decidirem se continuam ao serviço da UI ou se abandonam os cargos. Muitos dos que escolhem ficar atravessam a seguir um período muito difícil, como o juiz Santana da Silva, que esteve mais de 20 anos sem uma promoção. A maioria dos brâmanes católicos são substituídos nos cargos de decisão por hindus. A língua 
portuguesa desaparece dos currículos escolares. A relação de forças altera-se no novo Estado de Goa, e os cristãos, passam a estar em minoria. Os falantes de português sentem-se ostracizados e muitos optam por emigrar.
Só em 1985, por acção de um dos Governos presididos por Mário Soares, as relações entre Portugal e a UI entram num clima de razoável normalidade. É aberto primeiro um consulado português em Pangim, depois a Fundação Oriente instala-se numa magnífica casa branca no bairro das Fontainhas. Na Universidade de Goa começa a funcionar uma licenciatura em Língua Portuguesa e o Português regressa aos currículos do ensino secundário. O jovem Fausto Colaço é um bom exemplo dos novos tempos. Foi dos primeiros a completar o curso na Universidade de Goa e hoje ensina Português em diversas escolas em redor de Margão. "Há um grande interesse pela língua portuguesa, em especial por parte de alunos que sonham em fazer carreira fora de Goa", reconhece.
Durante os anos em que Portugal e a Índia estiveram de costas voltadas, quem manteve viva a cultura e a língua portuguesas foram os brâmanes e os padres católicos. "Dentro de casa, no seio da família, falamos português; cá fora falamos inglês, konkani, hindi ou o que for preciso", explica Fernando Jorge Colaço. Advogado da Fundação do Oriente, este goês formado em Lisboa prepara-se para publicar em português um livro contando a sua versão dos acontecimento de 18 de Dezembro de 1961. O advogado é apenas mais um da extensa lista de goeses que continuam a escrever e a publicar em português, onde se destacam os nomes dos escritores Carmo Azevedo e Carmo Noronha (recentemente falecido).
O Português permaneceu também vivo nos registos notariais e até nas leis que regem as questões de família e sucessões. O velho código de Seabra ainda está parcialmente em vigor para os nascidos no território. Padres como Avinash Rebello, da paróquia de Santa Cruz, continuam a ser os guardiões dos registos de nascimento e morte, e no seminário grande de Rachol continua a língua portuguesa voltou a ser ensinada. Em Pangim, todos os domingos, a missa é celebrada em português, para grande alegria de pessoas como Florêncio Ribeiro, alfaiate que há 40 anos cruza as estradas de Goa montado na sua bicicleta para costurar vestidos ocidentais nas casas indo-portuguesas. "Nasci português e vou morrer português. É o meu karma", diz. E sorri sem mostrar os dentes.



"O português está 'in'"
Kamalacant será um nome tão português quanto Santos, Silva ou Rodrigues? À primeira vista parece que não. Mas o senhor Kamalacant, Menino de nome próprio, jura que sim. "É um nome português e cristão sim senhor. Foi-me dado pelo meu pai, que também era um português puro", garante na língua de Camões, enquanto vai afinando o motor de uma motorizada Bajaj, na sua oficina no bairro das Fontainhas, em Pangim. Ali, a dois passos da casa branca da Fundação do Oriente, toda a gente reclama as suas raízes portuguesas. Falar português ou apenas ter um apelido vagamente lusitano é um sinal reconhecido de "status".
Mas não é só no labirinto das ruas das Fontainhas que, como refere o advogado Fernando Colaço, "o português está 'in"'. No exclusivo Hotel Forte Aguada, por exemplo, as refeições dos hóspedes são acompanhadas pela toada dolente de um fado cantado com um sotaque arrevezado. Ouvir cantar "Coimbra menina e moça" enquanto se come um caldo que é verde mas não é Caldo Verde é, no mínimo, surpreendente.
Quem anda por Goa acaba sempre por tropeçar em alguma coisa que lhe traz Portugal à memória. Seja as velhas tabuletas em português, a traça inconfundível das casas indo-portuguesas ou uma oração murmurada numa das centenas de igrejas e capelas brancas espalhadas pelo território. Ao final do dia dança-se um vira estilizado no convés dos barcos turísticos que cruzam o rio Mandovi. E pelas janelas abertas das casas de Margão, Mapusa ou Pangim chegam até à rua os sons da RTP Internacional, a nova "coqueluche" da televisão por cabo em Goa. Marques Mendes, Jorge Coelho ou Carlos Carvalhas nem suspeitam do sucesso extraordinário que os seus bonecos no Contra-Informação fazem entre os espectadores de Goa. E Nicolau Breyner pode dormir descansado, porque a telenovela A Lenda da Garça é um sucesso no antigo Estado Português da Índia, apesar de passar a um horário tardio.
Outro sinal de orgulho na herança portuguesa é a recuperação das espantosas casas indo-portuguesas espalhadas por todas as aldeias goesas. A Fundação do Oriente deu o exemplo ao subsidiar a recuperação de algumas casas nas Fontainhas, mas o principal trabalho está a ser feito por particulares como Aida Bragança ou Santana da Silva, que têm gasto fortunas para manterem de pé os palacetes de Chandor e Margão. Os novos-ricos de Goa, com os bolsos cheios de petrodólares ganhos no Golfo Pérsico, têm vindo a adquirir casas por todo o lado, como a casa grande cristã de Loutolim, que hoje apresenta a fachada recuperada.



A elite dos brâmanes católicos continua em progressiva perda de influência. Quem manda hoje em Goa é uma burguesia hindu ligada às minas de carvão e outros hindus de casta mais baixa que fizeram fortuna no Golfo e hoje mandam os filhos estudar para Bombaim, e até para a América e para a Europa. São quase todos oriundos de outras partes da Índia e continuam a chegar a Goa diariamente, trazidos pelos novos comboios da Konkani Railway. Os menos afortunados instalam-se em gigantescos acampamentos em redor das principais cidades e ganham a vida como trabalhadores braçais ou vendendo bugigangas aos turistas nas praias.
No aeroporto de Dabolim aterram todas as semanas dúzias de aviões "charter", trazendo turistas europeus, atraídos pelo sol das praias brancas de Goa. São quase todos ou muito jovens ou muito velhos. Os primeiros instalam-se nas "shacks" (pequenos hotéis e restaurantes à beira das praias) e cumprem o circuito das "rave parties" movidas a marijuana e música "techno". Os segundos refugiam-se nos hotéis de luxo, e só põem o nariz de fora para comprar algumas obras de artesanato nas lojas das redondezas a preços exorbitantes. O turismo continua a ser a galinha de ovos de ouro de Goa, e todos os dias surgem notícias sobre a construção de novos hotéis.
No meio de tudo isto, os brâmanes católicos agarram-se ao passado. Exaltam as suas raízes portuguesas, refugiam-se no catolicismo e vão fazendo o que podem para manter de pé as casas apalaçadas, com a ajuda do dinheiro enviado pelos parente que emigraram para Portugal. O seu tempo passou. Mas eles permanecem agarrados a costumes antigos, à espera de uma redenção que poderá nunca chegar.


Cristãos e Freedom Fighters



Os mendigos foram os primeiros a chegar. Alguns foram trazidos em braços até aos degraus da igreja matriz de Margão, outros vieram pelos seus próprios meios, deslizando em tábuas de madeira assentes em rolamentos ou precariamente equilibrados em muletas improvisadas com ramos de árvores. Depois chegaram os vendedores. Mais perto da igreja ficaram as bancas dos doceiros hindus, muito apreciados pelo paladar cristão, e logo a seguir instalaram-se os trens de cozinha de inox e latão, as panelas de barro e os brinquedos de plástico. Mais para o fundo, numa zona descampada, amontoaram-se os vendedores de mobílias, e um jovem amestrador de cobras conseguiu até encaixar-se num cantinho, entre uma cama de madeira trabalhada e um guarda-fatos cujo espelho reflectia as contorções dos répteis. Com quase um dia de antecedência, os comerciantes hindus montaram a sua feira à volta da igreja onde iriam decorrer as celebrações católicas da Nossa Senhora da Conceição. E sem darem qualquer sinal de impaciência por ali passaram a noite à espera dos devotos cristãos, que chegaram em hordas na manhã seguinte.
Ser católico em Goa implica militância. Implica uma devoção e entrega que dificilmente tem paralelo no Ocidente. A concorrência entre religiões é muita, e os cristãos estão hoje espartilhados pelo hinduísmo dominante e pelo islamismo crescente. A cultura goesa pode ser sincrética e dinâmica, mas é com temor que muitos cristãos assistem ao nascimento de templos hindus e mesquitas muçulmanas ao lado das velhas igrejas e capelas deixadas pelos portugueses. Ao contrário do que sucedia antes da integração na União Indiana, hoje os hindus representam mais de 60 por cento da população, contra cerca de 30 por cento de católicos. As vagas de imigrantes de outros pontos da Índia transformaram o tecido social de Goa e ameaçam a identidade dos cristãos.
Neste contexto, todas as celebrações religiosas são encarados como momentos de afirmação de uma cultura e de um modo de vida. Às festas da Senhora da Conceição em Margão, por exemplo, acorreram fiéis vindo de toda a Goa, numa manifestação de força e de fé. Na manhã do dia oito de Dezembro as missas sucederam-se ininterruptamente desde as seis da manhã, celebradas alternadamente em inglês e konkani. Na igreja matiz de Pangim o Pai Nosso foi rezado em português.
Os brâmanes católicos, no entanto, não parecem ter vocação evangélica. O programa dos festejos nocturnos, por exemplo, é feito à medida para afastar hindus e outras crenças. A música é uma mistura de xaroposas canções de amor ocidentais e modinhas portuguesas, e à porta do recinto fechado e com entrada reservada, cartazes avisam de que será servida unicamente comida não-vegetariana.
Esta atitude ajuda a confinar ainda mais os brâmanes católicos num gueto, e alimenta as críticas dos chamados "Freedom Fighters", organização cujos membros recebem do Governo indiano uma pensão de cerca de 2.500 escudos por terem combatido o colonialismo português. Os Freedom Fighters são também um anacronismo, mas ninguém os pode acusar de falta de actividade.
Foi em grande parte devido aos seus protestos públicos que redundaram num falhanço em Goa as comemorações da chegada de Vasco da Gama à Índia. São eles também que regularmente escrevem nos jornais exigindo que os nomes portugueses das cidades sejam substituídos por designações em Konkani. Foram eles, por último, que denunciaram as alegadas pretensões neo-colonialistas dos portugueses no momento da abertura do consulado em Pangim, ao mesmo tempo que punham a correr o rumor de que a Fundação Oriente era um ninho de espiões. Embora a maioria dos Freedom Fighters seja afecta ao Partido do Congresso, muitos transferiram-se nos últimos anos para Barathia Janata Party (BJP), o partido nacionalista hindu moderado que hoje detém o poder na Índia. Trinta e oito anos depois da integração do Estado Português da Índia na União Indiana, a luta continua para brâmanes católicos e Freedo Fighters. Tolhida por artroses e ligeiramente esclerosada, mas continua.