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terça-feira, 22 de setembro de 2015

CARTA DO AMIGO - Emanuel Medeiros Vieira

Carta do amigo...

ENTÃO

    Porque esconder? 
   Há uma enfermidade. 

   É preciso lutar – dia após dia, momento após momento. 
   Viemos de outras batalhas. 
   Mas só queria te contar, amigo Sérgio, que vou a Cuba – viver a vida, não sabemos nada sobre o amanhã, já não acredito em vida após a morte (a eternidade é o que deixamos aqui). 

   Cuba? 
   Defendi sempre a revolução. 
   Não, não mudei de lado. 
   Mas a vida me ensinou (e não sindicatos pelegos e a burocracia estatal do partido hegemônico) – e também as torturas sofridas durante a ditadura militar – que a democracia é um valor universal. 
   Não há o que discutir sobre isso. 
   E, sinceramente, hoje pouco me importa sobre o que os outros acham – só os amigos que valem a pena. 

   Quero conhecer o povo e não os burocratas. 
   E os amigos que foram à Cuba sempre falaram de um povo amorável, caloroso, simpático. 
   E bater pé, andar. 
   Defender o fim do embargo e a devolução de Guantánamo à Cuba – e a democracia. 
   Desde o início da doença (o tumor – sim, o tumor), vivia em função de exames, quimioterapias mensais, cirurgias,, aplicações, laboratórios, médicos, e enfermeiras etc. 

   Não, não estou reclamando. 
   Estou vivo. 

   Remei contra acorrente, e amando a vida, cheguei aos 70 anos. 
   Passaremos dez dias na ilha incluindo os voos, partindo de Salvador, com conexão no Recife, depois, Panamá e, finalmente, Cuba. 
   E quero bater perna, conversar com as pessoas, olhar, andar. 
   Por pouco não pego o Papa... 
   Estudei quase 10 anos (com Bolsa de Estudos) com os jesuítas e, apesar de eventuais divergências, aprendi muito. 

   Deixo um abraço aos meus amigos ilhéus e um forte para ti. 
   Até. 
  
   Avante! E pela vida! 

   Do amigo Emanuel Medeiros Vieira
(Salvador, 20 de setembro de 2015)

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

MISCELÂNEA - Emanuel Medeiros Vieira

EMIGRADOS
                     
Emigrados:
seremos sempre,
emigrados.
                                           
Em busca de outro mar,
da última ilha,
seguindo os pássaros,
atrás do último  pássaro.

De um mar a outro,
de uma ilha à outra ilha,
e, então, dormiremos,
uma noite sucedendo-se à outra.


HOMEM DIANTE DO MAR
    
Homem diante do mar
(instância interrogativa).
Precária caravela.
E finita: a vida

Trapiche:
o homem só contempla
(desembarcado).

No estatuto da memória:
ele se interroga, nunca mais a ação.

No porto: a rapariga rosada estendeu um lenço.
Limo: foram-se a juventude, o trapiche, a rapariga, o lenço.

(Mátria: sou apenas um homem diante do mar.)

Desterro: instante convertido em sempre.

O homem desembarcado só pode viver de memória: diante do mar.


EXÍLIO*
    
Um Atlântico nesta separação:
batido coração segue as ondas de maio.
Desterros além da anistia,
para lá dos poderes.
Velas ao vento,
não bastam os selos,
a escrita crispada.
Queria os sinais da tua pele,
vacinas, umidades, penugens,
pêlos perdidos no mapa do corpo,
o olhar suplicante, soluços.

Jornadas:
missas de sétimo-dia,
retratos arcaicos.
Outro exílio:
sem batidas na boca da noite, armas, fardas, medos,
clandestinidades.

Sol neste retorno:
casa, guarda-chuva no porão, caneca de barro,
álbuns, abraço agregador,
cheiro de pão, gosto de café,
o amanhã junta os dois nós da memória,
um menino e o seu outro: estou melhor feito vinho velho.


*Poema premiado no Concurso Nacional de Poesias, cujo tema foi “O Mundo do Trabalho”, promovido pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, Paraná.
       

MADONA
  
Senhora das horas inconclusas
Senhora do torto parto
                 do porto inalcançável   
Madona da ânsia infinita
                    vã peregrinação    
Senhora  do desassossego
Conceda-me o bálsamo do olvido
                       passagem silenciosa
                       travessia sem medo
Senhora do inútil tempo – que continua queimando
Senhora da veloz juventude
Madona de todas as velhices
Outorga-me o estatuto da ausência.


ASTROLÁBIO*
            Para Lucas, meu filho                                          
                                        
          A bússola e o astrolábio:
          velas ao vento. 
          Existe outro Bojador nestes mapas interiores?
          Os navegadores estão no exílio:
          há faróis neste degredo?
          Findou a aventura no mundo.

          Singrando-me, cumpro-me.
          Além de mim, além da vida:
          do pó que serei.
                                        
  *Poema premiado em concurso nacional  promovido  pela FUNARTE.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

VIAGEM

(Para Célia – que foi comigo)

No túmulo de Kafka, em Praga, eu pedi: “Orai, por nós”!
Foi súplica, imprecação.
Antes, agora. Sempre.
No cemitério “Père Lachaise”, em Paris, escrevi no (túmulo) de Proust: “Merci, Marcel”.
(Não, não fui apenas a cemitérios.)
E bati perna por Paris, fique contemplando o movimento nas escadeiras da “Opera”.
Ir e vir de gentes.
(No metrô – contemplando a mocinha com boina e meias  grandes – ela lia, não mexia  em
celular – pensei: não verei nunca mais esse rosto, nem os outros,  pessoas que vão e que vem.
 Andar – e andar mais ainda – é um dos prazeres maiores que sinto em Paris.)
Mas em relação às viagens da década de 70 – na época, com escasso dinheiro e fugindo da ditadura brasileira –, havia agora turista demais  – chineses, japoneses, brasileiros etc., todo mundo querendo comprar e não VER. Os  lugares cheios de gente.
Registrar: não ver. O viajante vê – o turista registra.
E fugia dos locais mais turísticos – por exemplo, andando e andando pela beira do Sena.
Não, desta vez nada do Louvre, Palácio de Versalhes (só andei pela cidade e pelo seu mercado).
No Portão de Brandemburgo, em Berlim, “ouvia” o som de paradas – vi pedaços do Muro.
E revi, numa longa e iluminada conversa, o meu velho amigo Flávio Aguiar.
E lembrei que – num inverno europeu há tantos anos (1971) –, eu o atravessara, e passara um dia em Berlim Oriental, com o meu saudoso amigo Alberto Albuquerque e, à noite, Luiz Travassos nos esperava  para tomar um vinho.
Lembrança de tanto sangue derramado: mas havia também Beethoven e Goethe.
Violência e beleza.
Um concerto: era Mozart em Viena.
Em Bruges, senti mais beleza. Era uma cidade revisitada.
(Na primeira viagem à Europa, década de 70, senti as pessoas menos estressadas e mais simpáticas. Em alguns países – estavam mais irritadas e antipáticas, como percebi na Espanha e na Itália.)
Tantos outros lugares não citados: como Santiago de Compostela. O que dizer? Já disseram tanto. Restam-me qualificativos que são lugares-comuns: linda, impactante. Mais que isso: cheia de uma energia que não sei definir.
E revistei o Porto – cidade que muito amei, e fiquei na casa de um querido casal amigo, revendo a queria Manaíra, conhecendo o André – ambos tão sensíveis e cultos, além de dialogar de novo com o combativo e humanista Carlos Mota.
Como Lisboa – conhecendo o cotidiano da cidade, as pessoas, a vida real -, parando no apartamento alugado pelo querido Fábio, sobrinho sensível, preparado, tão amigo e generoso que lá estudava. Ele já está de volta a Porto Alegre
Queria “segurar” a vida. Um instante. Uma eternidade. O rio que flui.
Driblamos a morte, “esquecendo” que – sem prorrogação, sem recursos, sem embargos – ela, inelutavelmente, nos alcançará na soleira da morte.
(Eu sei: só capto fragmentos, andando às pressas, numa narrativa quebrada – sempre em busca intensa de uma verdade humana. Consigo captar algo, não a totalidade. É da humana lida.)
Viajamos para o esquecimento. Mas “precisamos” viajar.
Em Dresden, sentei num banco à beira do rio –, e parecia inacreditável que a bela cidade barroca alemã, tivesse sido completamente destruída na Segunda Guerra.
É preciso escutar um fado, e contemplo o Tejo.
Ah, Lisboa revisitada de Pessoa!
Viajamos para encontrar o que já sabemos?
Chovia muito em Veneza, e fazia frio.
Em Londres, caminhei por parques.
E “enxergar”, ir além é fundamental (navegar é preciso –: ver e aprender é sempre necessário – se você  está sempre preocupado em ensinar, nunca vai aprender.
Na Picadilyy Circus (junção de estrada e de espaço público da Londres’s West na cidade de Westminster), num sábado à noite (acho que nunca vi tanta gente junta e de tantas nacionalidades,  um casal indagou-me se sabia o endereço de certa rua).
Em Amsterdã andei por canais, contemplando tantas pessoas andando de bicicleta, e (re) visitei o Museu Van Gogh.
Em Pompéia, pensei novamente na História (será ele sempre um pesadelo?), na vida e em todos os impérios que sempre passarão – apesar de considerarem-se eternos.
Onde estou? No quintal da minha casa? Atravesso mares para descobrir o que um menino, lá atrás, já sabia – encanto, finitude, sangue, esperança. A vida como um breve sopro que precisa ser vivido, a cada dia, sempre. Até.

(Brasília, novembro de 2014, e Salvador, maio e junho de 2015)

Emanuel Medeiros Vieira

EXEMPLO DE CIDADANIA E DE CONHECIMENTO DA HISTÓRIA DE PORTUGAL E DO BRASIL


Transcrevo aqui, com a devida vénia, um excelente Artigo dum cidadão brasileiro, militar profissional, que consubstancia um conhecimento invulgar da verdadeira História que liga umbilicalmente os dois país irmãos: Portugal e Brasil

<<
Quando, triste e envergonhado, leio a mentira divulgada em textos revisionistas e marxistas ... quando, feliz e orgulhoso, associo-me às comemorações da data magna de Portugal, ainda que dela nenhuma referência tenha encontrado na imprensa brasileira, brado com emoção ...”



...Obrigado, Portugal, Pátria-Mãe do meu Brasil!



Obrigado porque teus descobridores partiram da ocidental praia lusitana e, por mares nunca d’antes navegados, foram bem além do Bojador, além da dor, e descobriram para o mundo a terra onde eu nasci.


Obrigado por teres batizado esta parte do Novo Mundo de Terra de Santa Cruz, e que se fez conhecida como Brasil. Nas velas enfunadas da esquadra de Pedro Álvares Cabral, teus navegadores, a cruz e a espada lado a lado, revelaram-nos e marcaram-nos para sempre com a Cruz da Ordem de Cristo. E, de imediato, mandou o Descobridor celebrar missa em louvor a Nosso Senhor Jesus Cristo, fazendo do Brasil a Nação cristã da qual e do que todos nos orgulhamos. Obrigado pelo cristianismo!

Obrigado pela última flor do Lácio, inculta e bela! Porque tu, Portugal, nos colonizaste, herdamos o idioma que Luiz Vaz de Camões e Fernando Pessoa imortalizaram. Obrigado, pois que, assim, permitiste que na tua língua latina se imortalizassem Machado de Assis, Castro Alves, Olavo Bilac, Rui Barbosa, Gustavo Barroso e outros patrícios que bem a esgrimiram. Graças ao teu Português, ao nosso Português, os cento e noventa milhões de brasileiros se expressam e se entendem, emprestando unidade exemplar à Nação. É por meio do idioma de nossos antepassados luso-brasileiros que se entendem o caboclo da Amazônia e o capoeirista da Bahia, o jangadeiro nordestino e o empresário paulista, o gaúcho dos pampas e o seringueiro do Acre, o sambista carioca e o boiadeiro do pantanal, o seresteiro das Minas Gerais e o índio de todas as tribos. Obrigado pelo idioma que nos une e nos faz Nação!

Obrigado pelo território que nos legaste! Obrigado pela audácia, bravura, coragem, empreendedorismo e despojamento dos teus e dos nossos bandeirantes e entradistas que ousaram transpor Tordesilhas. Povoados e vilas, rios e campos, riquezas e ciência, tudo legaram em função da obra desbravadora que tanto enriquece nossa História. Pelas mãos daqueles bravos e dos homens do litoral, a Pátria foi sendo desbravada, demarcada e construída. Obrigado pelo território, magistralmente defendido por teus diplomatas, cuja obra tornou-se imortal nos teus tratados com Espanha, entre os quais sobressai o de Madrid. Obrigado pela terra que nos legaste.

Obrigado por esta mesma terra que para nós demarcaste e defendeste, semeando marcos, padrões e fortificações. Aí estão os fortes e fortalezas das Baías de Guanabara e de Todos os Santos. Aí estão as fortificações em todo o litoral, como, por exemplo, as do Recife, de Natal e Belém. Aí estão, sobretudo, provas da obstinação e da capacidade de teus engenheiros em Príncipe da Beira e em Coimbra.
Obrigado, pois, pela riqueza histórica e cultural que, por meio tuas obras defensivas, tu nos presenteaste.

Obrigado pela coragem e bravura, pelo espírito combativo e destemido com que tu, Portugal, lideraste lusos e brasileiros nas lutas contra o invasor francês, no Rio de Janeiro e no Maranhão. Assim também nos combates contra o ousado invasor holandês, na Bahia, em Pernambuco e em outras praias do Nordeste. Da mesma forma, com determinação, comandaste os teus e os nossos nas pelejas contra os ingleses na calha amazônica.

Obrigado pela integridade do patrimônio territorial, afirmada e confirmada pela transmigração de tua Corte para o Rio de Janeiro, o que fez do monarca português o único rei europeu a visitar e a viver no Novo Mundo. Não fora a sábia e oportuna decisão tomada pelo Príncipe Regente, quem sabe como teríamos nosso País, quase metade da América do Sul, do qual tão bem desfrutamos em pleno Século XXI?
Obrigado pelo legado da permanência da Corte no Brasil, de que são exemplos o Jardim Botânico e a Academia Militar das Agulhas Negras, o Banco do Brasil e o Arquivo Histórico do Exército, a Justiça Militar, a Polícia Militar do Rio de Janeiro e o Corpo de Fuzileiros Navais, exemplos lembrados a esmo entre tantos outros que bem poderiam ter sido recordados. Obrigado pela integridade do território.

Obrigado pela independência, proclamada pelo teu Pedro IV, que, em momento de magnífica lucidez e de amor ao Brasil, D. João VI deixou-nos como Príncipe Regente. Fizemo-nos independentes de ti, mas o sangue lusitano organizou o Império do Brasil e nos governou até a Regência. Não se pode esquecer que, também nas veias e artérias do brasileiro D. Pedro II corria o sangue de Portugal, filho de teu Rei D. Pedro IV. Obrigado pela voz que bradou “Independência ou Morte!”.

Obrigado pelo verde e pelo amarelo, nossas cores nacionais desde o Império e que perpetuaram, em nosso pavilhão, as cores das dinastias de Bragança e dos Habsburgos. Nelas, hoje e no mundo inteiro, encontramos nossa identidade e por elas somos prontamente reconhecidos. São cores que fazem bater mais forte o coração do
brasileiro. Elas estão em nossos quartéis, belonaves, aeronaves, edifícios públicos, estádios, legações e trajes desportivos. Obrigado aos da Casa de Bragança e aos da Casa dos Habsburgos por nossas cores nacionais.

Obrigado pelo jeito brasileiro de ser, tão marcado pela miscigenação adotada e praticada pelo colonizador. Porque os teus se miscigenaram, não somos racistas. Ao contrário, abominamos os que nos querem fazer ver e pensar de outra forma. Não fossem os teus e não teríamos as decantadas mulatas que tanto nos orgulham e que encantam platéias quando evoluem ao som de samba e do frevo, do maracatu e do boi bumbá.

Obrigado pelo legado artístico que hoje exibimos em nossas igrejas. São, os próprios templos, admiráveis obras de arte, com seus riquíssimos acervos em imagens, objetos de ouro e prata, pinturas e esculturas. Obrigado pelo que nos ensinaste e deixaste em arte sacra.
Obrigado pelo que nos ofereceste quando comemoramos, em 1972, o sesquicentenário de nossa independência. Deste-nos o corpo do próprio D. Pedro I, hoje guardado em venerável repouso no Monumento do Ipiranga, às margens do mesmo riacho no qual proclamou-nos Nação livre e soberana. Obrigado por deixá-lo repousar em terras brasílicas.

Obrigado pelos costumes, valores e tradições que nos fazem parte inconfundível da civilização ocidental. À tua predominante cultura somaram-se contribuições italianas e indígenas, espanholas e africanas, finlandesas e alemãs, japonesas e coreanas, holandesas e russas, todas artífices da cultura brasileira, perfeitamente integrada
e identificada à do Ocidente. Obrigado por nos ter aberto as portas do Ocidente cristão.


Obrigado por tudo, Portugal! Obrigado, Pátria-Mãe! 


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Paulo Cesar de Castro – General de Exército, atualmente na Reserva Remunerada, antigo Chefe do Departamento de Educação e Cultura do Exército.

segunda-feira, 20 de abril de 2015