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quinta-feira, 26 de março de 2020

MÁRIO FAUSTINO

CARO AMIGO CARLOS
BOM DIA!
SAUDAÇÕES!
ENVIO UM CURTO TEXTO SOBRE UM DOS MAIORES POETAS BRASILEIROS DE SUA GERAÇÃO - POUCO CONHECIDO E QUE MORREU COM APENAS 32 ANOS: MÁRIO FAUSTINO.

GOSTARIA QUE OUTRAS PESSOAS CONHECESSEM A SUA OBRA.

O BRASIL CONTINUARÁ A SER O PAÍS DO ESQUECIMENTO?

Fraternal e grato abraço do Emanuel

MÁRIO FAUSTINO (1930–1962)

Não conseguiu firmar o nobre pacto/Entre o cosmos sangrento e a alma pura/Porém, não se dobrou perante o fato/Da vitória do caos sobre a vontade/Augusta de ordenar a criatura/Ao menos: luz ao sul da tempestade./Gladiador defunto mas intacto/(Tanta violência, mas tanta ternura).” (...)
(MF)
Tão cedo morreu. E foi um dos maiores poetas de sua geração. E um dos temas mais obsessivos de sua obra foi a morte.
“Não morri de mala sorte/Morri de amor pela Morte”, escreveu ele.
Nasceu em Teresina, mas a maior parte dos seus estudos foram feitos em Belém.
Foi jornalista, tradutor, crítico literário e poeta.
Em 1955, publica seu primeiro e único volume de poemas: “O Homem e sua Hora”.
Em 1956, muda-se definitivamente para o Rio de Janeiro.
Torna-se editorialista do “Jornal do Brasil” e colabora com o famoso Suplemento Dominical (SDJB).
Um dos seus lemas foi: “Repetir para aprender, criar para renovar”.
Diz a lenda que ele pressentiu sua própria morte.
No início da década de 60, uma astróloga pressentiu uma catástrofe nos anos que viriam (segundo relato de Almir de Freitas).
Sua reação teria sido, inicialmente, um tanto cética.
Em 1962 – segundo informes – adiou o quanto pôde uma viagem para a Cidade do México e, quando finalmente decidiu embarcar, deixou à sua mãe e cunhada instruções minuciosas de como proceder no caso de um “desastre”.
No dia 27 de novembro de 1962, perto das 5h30, o Boeing da Varig em que estava preparava-se para uma escala em Lima, no Peru, quando espatifou-se no Cerro de La Cruz, matando todos os passageiros. Seu corpo nunca foi encontrado.
Assim, aos 32 anos, desaparecia um dos maiores talentos de sua geração.
Glauber Rocha (1939–1981), no seu belo e denso “Terra em Transe” (1967), homenageia-o transcrevendo os versos citados na epígrafe deste texto.
Sua morte, segundo Almir Freitas, abriu um vazio na inteligência brasileira.
Creio que sua obra, mereceria uma análise mais longa e densa.
Mas meu maior intuito é que as novas gerações possam conhecê-lo, pelo menos superficialmente.
Ironia (como quase sempre acontece na vida): contam que a casa em que viveu em Teresina foi demolida e lá foi instalada uma agência da Varig – a mesma empresa cujo Boeing em que ele estava, espatifou-se nas montanhas em 27 de novembro de 1962.

EMANUEL MEDEIROS VIEIRA (falecido em 29 de Julho de 2019)

quinta-feira, 19 de março de 2020

RUGGERO

ESTIMADO CARLOS
SEI QUE NÃO É ÉPOCA DE ENVIAR TEXTOS. FESTAS.
MAS NÃO QUERIA TERMINAR O ANO SEM TE REMETER O CONTO-REPORTAGEM INÉDITO.
É UMA MEDITAÇÃO SOBRE A OPÇÃO POLÍTICA, SOBRE OS SONHOS E FRACASSOS DE MINHA (nossa?) GERAÇÃO.
Sem imodéstia, trabalhei muito nele.

MUITO GRATO PELA EVENTUAL INSERÇÃO NO BLOG!
Afetuoso e grato abraço do Emanuel

 
RUGGERO

Em memória de Maria Aparecida (Cida) e Arnoldo Castanho de Almeida – irmã, cunhado, compadres – imensos e eternos amigos (dos maiores que já tive em minha vida) –, “encantados”, respectivamente, em 8 de outubro e 12 de julho de 2018

Lembro-me do padre jesuíta italiano Ruggero – tão alto – a gente varando noites, conversando sobre Teilhard de Chardin (1881-1955), Soren Kierkegaard (1813-1855), existencialistas cristãos como Gabriel Marcel (1889-1973) – que rejeitava o termo “existencialismo” –, Emmanuel Mounier (1905-1950) – fundador da revista “Esprit” –, agnósticos e ateus, como Albert Camus (1913-1960), Jean Paul Sartre (1905-1980), e marxistas como Maurice Merleau-Ponty (1908-1961).
No final – sempre no final – ele arrematava:
– Nunca te esqueças da Misericórdia Divina.
(Ele era sempre profundo, mas – nesta frase – queria ser abertamente “solar”.)
MISERICÓRDIA DIVINA.
Ele acreditava que eu era possuidor de uma “fé forte e cósmica”, mas que o tempo, as leituras e as dúvidas me afastaram dela.
– Quero te dar mais ÂNIMO, e falava mais alto e soletrava a palavra “ÂNIMO”.
Ria, me abraçava.
Ruggero era muito culto, leitor voraz, mas sua sabedoria maior era a simplicidade.
Tomávamos vinho, assistimos juntos duas vezes “O Sétimo Selo”, 1957, (“Det sjunde inseglete”) ”Morangos Silvestres” (Smultronstället”), 1957, de Ingmar Bergman (1918-2007).
Também vimos várias vezes a “Rastros de Ódio” (“The Searchers”), 1956, de outro grande mestre: John Ford (1894-1973).
Gostávamos muito também de Orson Welles (1915-1985) e assistimos algumas vezes “A Marca da Maldade” (“Te Touch of Evil”), 1958, que admirávamos muito, até mais que “Cidadão Kane” (“Citizen Kane”) 1941 – por muitos considerado o melhor filme de todos os tempos.
Um dia, ele morreu.
Tinha um carinho enorme pelos “humilhados e ofendidos da terra”, como dizia, pelos pobrezinhos, pelos sem nada.
Modesto, batina puída, evangelizava operários em comunidades pobres de Porto Alegre e pescadores em Florianópolis – não era amado pelos hierarcas, poderosos e conservadores da Igreja– afora a burguesia da capital gaúcha e da Ilha do meu nascimento.
Estávamos na década de 50 do século passado.
E um dia– parece incrível – fui eu a consolá-lo.
Triste, ferido com injustiças e perseguições (que não relato aqui), aquele sacerdote loiro (parecendo um camponês do interior de Santa Catarina), de quase dois metros, desajeitado, possuidor de um coração maior que ele, morando em uma casinha simples de madeira, num bairro humilde de Porto Alegre (antes estivera durante dois anos em Ponta das Canas, em Florianópolis, praia bela do Norte da Ilha de Santa Catarina, minha terra natal – ainda aprazível, pregando para os pescadores, dando para os pobres até a roupa do corpo, dividindo tudo o que tinha.
Foi o primeiro padre socialista que conheci – visceralmente autêntico.
Sempre achei que ele nascera na época errada. Deveria ter vivido na época das Catacumbas, levando a palavra de um Jesus pobre e libertador contra o Império Romano.
Resolvemos entrar na AP (Ação Popular) – organização originária da esquerda católica –, mas isso é outra história.
Ele lembrava-me o corajoso Padre Nando, do romance ”Quarup”, 1967” (um dos mais belos da literatura brasileira), de Antônio Callado (1917-1997) que, no final, opta pela luta armada no combate à ditadura militar.
Escrevi acima: Um dia, ele morreu.
Qual a causa (indagam)? Foi “pelo coração” – ataque cardíaco. Mas acho que morreu de tudo, de tudo um pouco, devido às perseguições sofridas, às injustiças que percebia no tão imperfeito mundo, à inveja de que foi vítima, difamado por tantos seres medíocres e mesquinhos.
Havia abandonado a batina, voltou para a Itália, mas retornou ao Brasil para se despedir.
Então, já era um velho, cabelos brancos, parecendo mais baixo, o olhar azul mais triste.
– “Desta vez, fui eu quem perdi a Fé”, me confessou.
Tentei animá-lo, não falando em igreja, “reconversão”, nada. Mas nos filmes que havíamos assistido juntos.
– Não há nada depois daqui, ele disse.
“Depois daqui” era depois da vida terrena– é claro (sinto-me agora redundante).
Hoje, no crepúsculo da minha vida, doente, vejo o seu rosto. É um retrato que mandei emoldurar.
Mostrava o momento de um churrasco numa chácara em Viamão, com poucas pessoas, eu, Décio Andriotti (que morreu em Milão, aos 85 anos, em 29 de abril de 2018, um domingo), Eduardo Dutra Aydos, Rogério Scanzerla (1946-2004), e sua então mulher Helena Ignês.
1969. Rogério fora lançar em Porto Alegre, no extinto “Cine Marrocos”, no bairro Menino Deus, o seu hoje clássico “O Bandido da Luz Vermelha” (1968).
Tomamos vinho, ríamos muito. Era a celebração da amizade.
Devo ao Décio – meu professor no antigo Ginasial (1958-1961) do “Colégio Catarinense”, em Florianópolis –, ao meu ex-professor no Clássico (1962-1964), “Colégio Anchieta”, Porto Alegre, também jesuíta (nos dois educandários estudei com bolsa de estudos), a o Roberto Figurelli, ao Paulo Fontoura Gastal (1922-1996), minha paixão pelo cinema. Em ambos, tinha bolsa de estudos.
Ruggero, para mim, era um “romântico crepuscular”.
Ele achava o mesmo de mim.
Ofertou-me ÂNIMO – com seu enorme coração e compaixão – e não está mais aqui.
Mas não restou o oblívio. A fé vai e volta. Aparece, desaparece. Está mais longe da infância do que eu mesmo. Do que eu queria. Do que meus pais aspiravam. Tenho culpa? Deus perdeu o meu passaporte? Do meu país? Estou sentimental demais?
Ele era daqueles seres que só aparecem de vez em quando. Muito poucos homens chegam como tu, Ruggero.
Nunca te esquecerei. Devo a ti o que chamo de “HUMANISMO EM TEMPOS ÁSPEROS E DISTÓPICOS”.
Sinto-o (RUGGERO) presente – como vários amigos já mortos – em muitos momentos (a maioria) desta vida – na sua reta (ou curva) de chegada.

EMANUEL MEDEIROS VIEIRA (falecido em 29 de Julho de 2019)

terça-feira, 10 de março de 2020

AMIZADE

AMIZADE


Era só amizade. Ela não tinha paixão por mim, eu também só a queria como amiga.
As pessoas não acreditam que isso possa existir.
Assim, não liberávamos os “baixos instintos”, como em certas estórias de “amor”:
ciúme, raiva, posse, agressão etc.
Sempre caminhávamos.
Era uma manhã de sol pleno, maio, Planalto Central do país.
Alice tinha uns olhos “de verdade”. Seus interlocutores não a enganariam com facilidade.
E ela pegava na veia, ia direto ao ponto:
– “O que é pior: o câncer ou a tortura?”
A tortura.
– “Por quê?”
A tortura “fica” para sempre. O câncer, mesmo com reza brava, mata.
Ela parecia estar compadecida.
Eu temia cair na autopiedade.
Lembrei do que um cineasta dissera, quando indagado se acreditava no inferno “cristão”.
Ele não respondeu que o inferno era aqui mesmo.
Mas para ele, o inferno não existiria – seria apenas um mito.
O inferno era a ansiedade e a depressão – disse.
Alice complementou: “E a insônia”.
Eu iria dizer – mas pareceria pomposo: e a injustiça.
Mas a injustiça não era um inferno em si, mas uma espécie de “antivalor”.
– “Nas estórias, as pessoas dizem frases heroicas, retumbantes, na hora de morrer”,
ela disse.
Eu olhei para ela, uns bonitos olhos azuis, alta, magra.
Complementou:
– “O que você diria?”
Repetiria mestre Machado de Assis no sexto capítulo do seu romance “Quincas Borba”: “Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”.
– “Você é um romântico confesso: não diria isso”, Alice riu.
“Espírito Santo, entra na minha vida”, reivindicava meu pai, e dizia que, durante a existência, eu deveria pedir o mesmo. Ele era autêntico.
Alice perguntou:
– “Entrou?” – o Espírito Santo.
Fingi que não tinha escutado a indagação.
“Espírito Santo, toca a minha vida”.
– “Tocou?”
“Espírito Santo, renova a minha vida”.
– “Renovou?”
Não fingi mais que não havia escutado.
Disse:
Talvez Ele tenha deixado para fazer tudo isso na Hora Suprema.
Eu driblara a morte algumas vezes, mas ela ganharia sempre: tinha todo o tempo do mundo.
– “Vão te chamar de pessimista...”
Eu já estou acostumado. Só escrevo o que sinto. Não sou relações públicas nem marqueteiro.
Meu pai acreditava que o Bem iria vencer. Mas muitas vezes advertiu: “Não
subestimes a força do mal, meu filho”.
Subestimamos. Quebramos a cara.
Eu falei: Alice, quando passo por jardins de infância, vendo crianças muito pequenas, fico pensando nelas – não agora, mas no futuro.
– “Você sempre procurou entender a genealogia do Mal”, ela disse.
– Por essa razão sempre li Dostoiévski, tentei brincar.
E pensei nesta gênese, através de Stavrogin – o personagem do escritor russo, em “Os Demônios”.
Seminal? Niilista total. Ele era tão forte que não conseguia defini-lo.
Foi um personagem premonitório que “antecipou” a Revolução Russa?
Não saberia dizer.
– “Citas muito”, falou Alice.
– “Quem não te conhece, poderá dizer que és um ‘filósofo de boteco”, complementou.
Eu iria dizer: não ligo. Mas me importava sim.
Ela percebeu o meu desconforto e tentou suavizar.
– “Essa autenticidade total é impossível”, Alice comentou.
– “Queres captar tudo, sentir tudo, como uma esponja que tudo absorve”.
Fiquei em silêncio.
– “Muitos poderão pensar que é mera erudição, em uma estória na qual nada acontece”, reforçou.
Simulei um sorriso – era mais uma careta.
Ela olhou para mim.
– “Ficaste chateado ou aborrecido?”
Não.
– “E depois de Dostoiévski, buscaste entender ai culpa sem sentido”.
Sim: gosto muito de Franz Kafka.
E busquei entender o pecado e a Graça – redenção – lendo o cristão Graham Greene.
Mas na hora final, Alice, tentarei levar comigo a imagem de um berço, olhando, pedindo que alguma “força maior” protegesse uma menina, ainda um bebê e, anos depois, um menino.
Não ficaram comigo, mas essa imagem ficará para sempre – colocava música numa vitrola para eles, sim, rezava.
Ela agora é adulta, ele adolescente.
Iria falar em “perdas”, mas temi cair no sentimentalismo e no vitimismo.
Seria piegas se caísse na queixa.
Ela riu de novo, me beijou no rosto, nos despedimos, a manhã terminava, as crianças saíam da escola, cada um com suas vidas – era apenas mais um dia, um dia nas nossas existências – que passaria também, e não sei a razão, em casa, fiquei olhando – e
contemplando mais – uma foto emoldurada dos meus pais mortos.

EMANUEL MEDEIROS VIEIRA (falecido em 29 de Julho de 2019)

Nota: Segundo informação do Emannuel, aquando do envio para mim, este Poema está publicado na Revista ANE,

terça-feira, 3 de março de 2020

ANALFABETOS FUNCIONAIS

ANALFABETOS FUNCIONAIS

Como votar com consciência e não ser ludibriado por marqueteiros muito bem pagos, nem ser enganado por "Fake News", que inundam as redes sociais?
É preciso saber onde pisamos.

Três em cada dez jovens e adultos de 15 a 64 anos no País - 27 por cento do total, o equivalente a cerca de 38 milhões de pessoas - são considerados analfabetos funcionais.
Como esclarece matéria de Isabela Palhares e Juliana Diógenes, esse grupo tem muita dificuldade de entender e de se expressar por meio de letras e números em situações cotidianas" (...).
O estudo foi realizado pelo Ibope Inteligência, e desenvolvido pela ONG Ação Educativa e pelo Instituto Paulo Montenegro. 
Nessa faixa de 29 por cento de brasileiros classificados nos níveis mais baixos de proficiência em leitura e escrita, há 8 por cento de analfabetos absolutos (quem não consegue ler palavras e frases).
Os outros vinte e um por cento estão no nível considerado elementar (não localizam informações em um calendário, po exemplo).

Poderia desenvolver mais um tema tão importante. 
Mas não quero cansar o leitor - já saturado de tantas informações (falsas ou verdadeiras).
Mas lembro do diagnóstico de Ocimar Tavares, professor da Faculdade de Educação da USP: "Não há politicas consistentes e inteligentes na educação de jovens e adultos. Não têm condições pedagógicas - um exemplo são as salas superlotadas. E muitas políticas são interrompidas".

ELEIÇÕES
Como disse alguém, difundir ideias sob o manto do anonimato de quem pagou para difundi-las "não é apenas um crime, é um atentado à democracia, o vale-tudo em eleições".
Muito dizem: "a gente faz o diabo". 
Mas o diabo mora nos detalhes e "costuma se voltar para quem os soltou".

EXPLICAR
"É dificil explicar para o sujeito cujo ganha-pão  é não entender o que você está tentando explicar".
(Upton Sinclair - 1878/1968

EMANUEL MEDEIROS VIEIRA (falecido em 29 de Julho de 2019)